Miguel Serrano - Trecho de NOS o livro da ressurreição

Trecho traduzido por Christa Savitri

"Um Ovo, que era todo o mundo não-criado, com paredes transparentes, que deixavam-se mostrar até um não-exterior. E ali era a residência de Ellella. Na respiração do Grande Ovo, de vez em quando, como algo que sucedia antes dos segundos e das horas, apareceu a cor verde, o que tinha sido uma estrela, ou um raio, mas que fora sempre o Grande Ovo, imóvel, cosmogônico. Se virtualizou uma música, um som; melhor dito, a semente de uma música, seu insinuado tremor. E esse ser que ali estava completo, eterno, como que dentro do Grande Ovo, desprendeu um vapor verde, e, nessa música apenas, o vapor verde se condensou e Ella se opôs a El, como no jogo de um respirar, ou na simulação de uma dança. Mas todavia, não era. Com pressa a reincorporou, respirando a si mesmo, sendo outra vez Ellella. 

Mas, o sucesso  já se tinha tentado, o Tempo estava pressentido. A casualidade se transformou em destino dentro do Grande Ovo. A respiração passou a fazer-se rítmica, ainda quando sempre dentro de essas paredes de gelo transparente. E cada vez que o Ser expirava, Ella ia afora e dançava um pouco, coberta de uma placenta verde, até que El a inspirava como imerso em um gozo de horror, rápido, rápido, para não deixar de recuperá-la. E adveio o novo azar-destino. Se desprenderam de Ella os véus verdes. E El a viu pela primeira vez desnuda, com seu corpo feito de tempo respirado, de jogo e dança. E toda a sua eternidade não lhe bastaria para contemplá-la desnuda. Em êxtase e pavor verde. E como o tempo pela primeira vez sucedeu, circularmente como sua respiração, que agora ia girando como uma estrela. Ella se fez dura, retendo substância e forma, até chegar a contemplá-lo também, de fora. E ainda que intentasse voltar já não poderia, pois não cabia, não entrava. Foi solitária por um instante, mas assim mesmo pressentiu que poderia ser bom para si mesma. E se colocou a dançar mais rápido, mais rápido, para mantê-lo em sua explosão. E quando Ele voltou, todo esforço fora em vão para reincorporá-la , pois a porta havia diminuído ou fechado, deixando já sem controle, livre, a terrível fêmea. E ao aproximar-se dela, sentiu a vertigem de sua própria carne tocando-se ao outro lado de um espelho. E foi Ella quem adentrou seu corpo. Mas isso já não era o mesmo. 
Não se saberá nunca quem rompeu as paredes do Ovo Cósmico. Se El ou Ella. O Ovo se converteu em estrela, em estrelas, em música de esferas. Alguém se manteve esperando como às bordas de uma fonte, onde a história do Eros Cosmogônico se guarda em segredo, num mistério impenetrável. 

Se disse que foi Ella que rompeu as paredes do Grande Ovo, que foi a ativa e que El permaneceu imóvel, como paralizado. Mas, o vimos, foi El que começa a respirá-la, projetando-a como a imagem de um sonho, para vê-la desdobrando-se, iniciando a separação incerta acreditando que o ama. É El que inventa esse quase-amor. Mas sempre se disse que foi Ella, a sedutora, a bailarina dos tules verdes, que deu começo ao fluxo das águas do rio das formas, ao jogo alucinante de chegar a contemplar-se nos espelhos. 

Mas, não havia algum outro oculto, dentro ou fora do Grande Ovo que pré-insinua o Drama? Outro que descobriu a maneira de introduzir-se através das paredes de vidro congelado? 

Além disso não há nada, só Ovos, mais Ovos. Porque esse drama se produz em um só deles. Nos outros, ainda está a eternidade de ELELLA, como um ato inviolado."

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